Even if the tondo (circular) shape of certain reliefs echoes the history of shaped canvas, Parada leads viewers to the inner visual pattern, rather than offer them an object of study to be observed coldly from a distance (we have in mind Mark Rothko or Barnett Newman, who advocated a reduced distance between their work and spectators with the purpose of enhancing the feeling of immersion). That absorption tropism – both of the eye and of the body – is crucial in relief painting. Such practice is actually paradoxical in Parada: it leads to the coexistence, which is not simple, of the undulatory and phenomenal nature of life and the invariable hardness of the “lapis lazuli”, the geometric rigor of the pattern and the curved materiality of the relief, whose prominences and recesses evoke those shapes in the human body. A recent relief, Inverted Cascade (Cascata Invertida – 2020), displays a clear wave motif, that is true, but turned upwards, inverting the sense of gravity. Various excrescences, at times organic, recurrent to viscera, at times geologic, recurrent to rocks, emerge from those vertical waves. Their strangeness, which may raise certain aversion, refutes the ornamental label to which the artist could be wrongly associated. Having been developed for about ten years, as unique and promising as such practice may be, it is part of a wider historic perspective.
Parada’s artistic creation is rooted in the post-war years in the mingling of abstract art and perception psychology, optical rule and manual trace, kinetics and neo-concretism, geometry and psychedelia. Among the avant-garde actors, German Heinz Mack – founder of ZERO Group in 1957 with the works Metallreliefs or Lichtreliefs – starts a constant dialogue between order and chaos, matter and light that was important for Juan Parada. Although abstract, his two works evoke the action of natural elements – sunlight, wind, and rain in aquatic or desertic surfaces – whose appearance owes nothing to chance but rather comes from the action of fluid forces over malleable material, without at the same time disregarding the rigorous economy of Lee Ufan’s visual means (with simple touches of paint on relief on immaculate canvases). The general result of this process naturally evokes Piero Manzoni’s pleated fabric covered with white kaolin in his series of “Achromes”. However, while the work of the Italian artist reminds us of the folds in the sculptures of Ancient times, that of Mack’s and Parada’s stand out from their natural echo and their perceptive dynamics.
Heinz Mack gave his view about the desire to separate the phenomenic and perceptive aspects of the work from its strictly material support: “I could no longer see a metal relief, but a vibrating, pulsating structure made of light. My feeling was that the structure hovered over a metal relief, getting detached from it, as the reflection of light on the ocean that starts vibrating under intense sun and taking up the appearance of a rug of light made of dancing ligh” . Resorting to different aesthetic and material terms, through a material, tangible mould, Juan Parada’s aim is to make us aware of the undulatory, rhythmic, corporified nature of life, as the last resistence to the transformations in the digital world.
As turbulências cerâmicas de Juan Parada
Matthieu Poirier, 2020
Na era atual das impressoras 3D que expelem vagarosamente um fio de plástico derretido para materializar uma sequência digital de abscissas e ordenadas, Juan Parada (nascido em Curitiba, em 1979, atualmente vivendo e trabalhando em São Paulo) explora uma via escultural inteiramente diferente. Seus relevos, dos quais trataremos aqui, nascem da alquimia da cerâmica e de seu lento processo – orquestrado pela mão e pelo calor do fogo – que leva do “húmus” da terra ao “lápis-lazúli” da pedra. No entanto, diferentemente da cerâmica milenar, essa transmutação não para na queima, mas se estende pelo aspecto versátil das obras e pelas suas muitas ressonâncias com a vida.
Com efeito, o processo de realização dessas pinturas em relevo mostra-se livre de nostalgia do artesanal, na qual Last tweaks Os diversos micro-padrões e modulações luminosos revelam- se apenas ao observador atento, como em Estratificação Geométrica (2019), na qual a forma facetada de cada módulo produz um jogo de luz e sombra, dando a impressão de cores e tons instáveis. A cerâmica é considerada por Parada um “meio elástico”, de “natureza mais subversiva”, ao contrário das limitações impostas pelo seu uso tradicional. Assim moldada e harmonizada na sua composição, cada obra surge como um labirinto dotado de mil entradas e saídas, através do qual o olhar – canalizado, pois submetido a esta condução hipnótica – retorna constantemente em seu caminho. As correntes e ondas petrificadas, como que interrompidas em seu movimento, tal qual fragmentos congelados de um continuum, retêm o olhar – tem-se aqui em mente The Great Wave off the Coast of Kanagawa, a famosa gravura de Hokusai (1830).
A complexa geometria ondulatória que norteia principalmente os patterns óticos de Estranhos Atratores I e II é herdada de artistas do neoconcretismo. Podemos citar, por exemplo, Lygia Clark. Seu primeiro Bicho, em 1960, já aliava o rigor geométrico à variabilidade dos seres vivos, e foi dado a Sérgio Camargo, cujos relevos monocromáticos, povoados por pequenos cilindros cortados, eram igualmente ambíguos. Além dessa referência óbvia, Parada também toma emprestado o movimento característico de seus patterns da arte cinética dos anos 1960 e 1970, como de Bridget Riley, Enrico Castellani e Abraham Palatnik. No entanto, seus relevos, como Linhas de Força (2016), remetem a elementos biológicos – como teias de aranha e a carapaça ou pele de certos répteis – pois Juan Parada apresenta acima de tudo uma estética naturalista, orgânica (mesmo visceral). Pequenas ondas de areia criadas pelas correntes marítimas lhe servirão, por exemplo, de ponto de partida para os relevos da série Elogio à Água (2018), cujos moldes foram confeccionados diretamente nas praias de Superagui (especialmente preservadas da presença humana).
Uma história naturalista, até mesmo ecológica, se revela igualmente nas primeiras esculturas de vidro transparente em forma de colmeia e com conteúdos vegetais diversos (Série Invólucros, 2013-15), destinadas a serem inseridas nos relevos arquitetônicos. Já os Volumes Simbióticos (2011-12) evocam as formas básicas da Minimal Art – como os L-Beams (1965) de Robert Morris –, mas com uma das superfícies, externa ou interna, dotada de abundante vegetação. Essas formas por vezes chegam a envolver o observador – à maneira de Anish Kapoor –, mas em uma matriz muito densa, constituída de plantas e flores (Memória da Matéria, Museu da Gravura, Curitiba, 2012). Aliás, somente em 2018 esse tipo de ambiente foi mineralizado, com a obra Glaciares, que incorpora uma superfície all-over em cerâmica monocromática. Trata-se de um quadro panorâmico de imersão, evocando a curva panorâmica das Nymphéas, de Claude Monet, no Museu Orangerie em Paris (1915-26).
Mesmo que a forma em tondo (circular) de certos relevos ecoe a história da shaped canvas, Parada direciona o espectador ao interior do padrão visual, em vez de lhe oferecer um objeto de estudo a ser observado à distância, friamente (temos aqui em mente Mark Rothko ou Barnett Newman, que preconizavam uma distância reduzida entre suas obras e os espectadores, no intuito de aumentar a sensação de imersão). Esse tropismo de absorção – tanto do olhar como do corpo – é essencial nas pinturas em relevo. Tal prática é, aliás, um paradoxo em Parada: faz coexistir, e isso não é simples, o caráter ondulatório e fenomênico da vida com a invariável dureza do “lápis-lazúli”, o rigor geométrico do pattern e a materialidade curvilínea dos relevos, cujas saliências e reentrâncias evocam as do corpo humano. Um relevo recente, Cascata Invertida (2020), apresenta claramente um motivo de onda, é verdade, porém voltada para cima, invertendo o sentido da gravidade. Várias excrescências, ora orgânicas, remetendo a vísceras, ora geológicas, evocando rochas, emergem dessas ondas verticais. A sua estranheza, podendo despertar certa aversão, refuta o registo ornamental ao qual se poderia erroneamente associar o artista. Essa prática, que se desenvolve há cerca de dez anos, por mais singular e promissora que seja, insere-se em uma perspectiva histórica mais ampla.
O fazer artístico de Parada tem suas raízes nos anos do pós-guerra, quando se misturam arte abstrata e psicologia da percepção, régua óptica e traço manual, cinetismo e neoconcretismo, geometria e psicodelia. Entre os atores de vanguarda, o alemão Heinz Mack, – fundador do grupo ZERO, em 1957, com as obras intituladas Metallreliefs ou Lichtreliefs – estabelece um diálogo constante, importante para Juan Parada, entre ordem e caos, matéria e luz. Embora abstratas, suas duas obras evocam a ação de elementos naturais – luz do sol, vento e chuva em superfícies aquáticas ou desérticas –, cuja aparência não deve nada ao acaso, mas surge da ação de forças fluidas sobre um material maleável – sem desconsiderar, ao mesmo tempo, a rigorosa economia de meios visuais de Lee Ufan (dando simples toques de tinta em relevo em telas imaculadas). O resultado geral desse processo evoca, naturalmente, os tecidos plissados e recobertos com caulim branco de Piero Manzoni, para sua série de “Achromes”. Porém, enquanto o trabalho do italiano lembra as dobras das esculturas da Antiguidade, as obras de Mack e de Parada distinguem-se por seu eco natural e sua dinâmica perceptiva.
Heinz Mack expressou do seguinte modo esse desejo de separar a parte fenomênica e perceptiva da obra de seu suporte estritamente material: “Eu não enxergava mais um relevo de metal, mas uma estrutura vibrante e pulsante, feita de luz. Minha impressão era de que a estrutura pairava sobre o relevo de metal, dele se separando, como o reflexo da luz no mar que começa a vibrar sob o sol intenso, assumindo a aparência de um tapete de luz feito de reflexos de uma luz dançante” . Com outros termos estéticos e materiais, Juan Parada pretende, através de uma matriz material e tangível, tornar-nos conscientes da natureza ondulatória, rítmica e corporificada da vida, como resistência última ao devir digital do mundo.